No dia 23 de abril, celebramos uma década desde a implementação do Marco Civil da Internet no Brasil. Esta legislação pioneira delineou os direitos, deveres e princípios que regem o uso da internet em nosso país, marcando um marco significativo na evolução do ambiente digital brasileiro.
- Siga o tecflow no Google News!
- Participe dos nossos canais no Twitter, Telegram ou Whatsapp!
- Confira nossos stories no Instagram e veja notícias como essa!
- Siga o tecflow no Google Podcast e Spotify Podcast para ouvir nosso conteúdo!
- Anuncie conosco aqui ou apoie o tecflow clicando neste link.
Antes da promulgação do Marco Civil, o cenário digital carecia de regulamentações claras. A falta de exigências quanto à guarda de dados dos usuários permitia potenciais abusos sem responsabilização adequada. Por outro lado, a obtenção de informações pessoais por parte dos provedores de internet levantava preocupações sobre violações de privacidade. Além disso, a ausência de legislação específica sobre a responsabilidade dos provedores quanto ao conteúdo publicado por terceiros gerava incertezas jurídicas.
Nos últimos anos, temos observado diversas propostas de alteração no regime de responsabilidade civil estabelecido pelo Marco Civil. Muitas dessas sugestões buscam aumentar a responsabilidade das plataformas online, o que poderia implicar em uma intensificação dos controles de conteúdo.
Para Renata Idie, sócia da Daniel Advogados, “Embora as alterações propostas tenham como objetivo principal a criação de um ambiente digital mais seguro, é crucial considerar os potenciais impactos, como a possível restrição à liberdade de expressão. A ameaça de maior responsabilização pode levar as plataformas a adotarem uma postura mais conservadora, resultando na remoção de conteúdos que, de fato, são legítimos, especialmente em situações onde há ambiguidade.”
Renata destaca ainda a complexidade da questão, enfatizando que “A avaliação da legalidade de um determinado conteúdo frequentemente depende de uma análise subjetiva do contexto, o que torna o debate ainda mais intricado”.
Esta entrevista exclusiva concedida ao tecflow, a especialista aborda os desafios e perspectivas relacionados ao Marco Civil da Internet e suas implicações no Brasil. Confira abaixo!
Renata Idie, sócia da Daniel Advogados.
1. Como você avalia o impacto do Marco Civil da Internet nos últimos 10 anos em relação aos direitos, deveres e princípios para o uso da rede no Brasil?
Entendo que o impacto foi muito positivo, tanto para conferir maior segurança jurídica para as empresas atuarem no País, como para auxiliar na defesa dos direitos dos usuários.
2. Quais foram as principais mudanças observadas no cenário da internet brasileira desde a promulgação do Marco Civil, especialmente em termos de guarda de informações e responsabilidades dos provedores de serviços?
Antes do MCI, não havia legislação específica que obrigasse os provedores (aplicação e conexão) a armazenarem informações que são essenciais para a identificação dos usuários e nem em quais hipóteses poderiam ser fornecidas para terceiros, de modo que alguns provedores sequer as armazenavam e outros as forneciam sem ordem judicial.
Na prática, as disposições trazidas pelo MCI foram de extrema importância para possibilitar que uma pessoa que comete um ilícito por meio da Internet possa ser identificada e responda pelos atos que cometeu, impondo uma barreira ao anonimato, bem como para proteger a privacidade dos usuários.
Com relação à responsabilidade, um dos pontos tratados pelo MCI foi especificar em quais situações as plataformas poderiam ser responsabilizadas por conteúdo publicado por seus usuários. A lei estabeleceu, com algumas exceções, que a plataforma somente seria responsabilizada se não removesse o conteúdo após determinação judicial.
Antes da promulgação do MCI, havia decisões em diferentes sentidos, prevalecendo, naquele momento, a possibilidade de a plataforma ser responsabilizada se não removesse o conteúdo após solicitação extrajudicial.
3. Como você enxerga as iniciativas recentes que propõem alterações no regime de responsabilidade civil estabelecido pelo Marco Civil da Internet? Quais são os principais argumentos a favor e contra essas propostas?
Além de haver tipos de iniciativas distintas, são muitos os argumentos contra e a favor das alterações. Entendo válido trazer aqui que um dos pontos centrais trazidos pelos dois lados do debate são: de um lado a necessidade de que, dado o contexto atual – em especial as discussões sobre fake news no contexto eleitoral e a utilização de algoritmos mais precisos para direcionamento de conteúdo – se colocou em discussão a atribuição de maior responsabilidade às plataformas no controle de conteúdo para que a Internet seja um ambiente mais seguro e, de outro lado, que a atribuição de maior responsabilidade poderia implicar na ocorrência de censura.
A meu ver, os debates são sempre válidos e extremamente importantes para que tenhamos leis que sejam condizentes com a realidade e que possam melhor contribuir para a sociedade, mas é igualmente essencial que estes debates sejam conduzidos de maneira responsável, cautelosa e consciente.
4. Quais são os possíveis impactos da atribuição de maior responsabilidade às plataformas digitais em termos de liberdade de expressão e acesso à informação?
É importante ponderar que atribuir maiores responsabilidades aos provedores de aplicação pode significar maior autonomia para que a iniciativa privada julgue a permanência ou não de um determinado conteúdo com seus próprios critérios.
Por exemplo, é possível que ao ver aumentada as chances de responsabilização, as plataformas passem a adotar postura mais restritiva, removendo conteúdos que sejam lícitos, especialmente em casos em que há dúvida, para evitar arcar com eventuais prejuízos de sua manutenção, o que pode trazer prejuízo à liberdade de expressão e acesso à informação.
5. Como as plataformas digitais podem equilibrar a necessidade de segurança online com a preservação da liberdade de expressão, especialmente diante de uma possível postura mais restritiva para evitar responsabilizações?
Esta é uma questão bastante complexa. Uma boa iniciativa que podemos citar é o oversight board, que consiste na criação de um “Comitê de Supervisão” composto por pessoas diversas e com conhecimento para analisar os casos de pedido de remoção.
6. Diante da complexidade na avaliação da licitude de conteúdos online, quais são os desafios enfrentados pelos provedores de serviços e pelas autoridades reguladoras? Como esses desafios podem ser abordados de maneira eficaz?
A avalição de um determinado conteúdo muitas vezes depende do contexto situacional (político, cultural e social), o que é um grande desafio quando se está analisando a licitude do conteúdo, especialmente considerando o alcance global da rede. Por exemplo, o que é considerado ilícito em um país pode não ser considerado no outro, seja por divergência de legislação ou por questões culturais.
Por isso, um ponto importante a ser considerado é a necessidade de esforços internacionais quando se fala de construção de um ambiente digital mais seguro.
Faça como os mais de 10.000 leitores do tecflow, clique no sino azul e tenha nossas notícias em primeira mão! Confira as melhores ofertas de celulares na loja parceira do tecflow.
Marciel
Formado em jornalismo, o editor atua há mais de 10 anos cobrindo notícias referente ao mercado B2B. Porém, apesar de toda a Transformação Digital, ainda prefere ouvir música em disco de vinil.